Educadora colombiana apresenta o livro "Ler e Brincar, Tecer e Cantar: Literatura, Escrita e Educação" (Pulo do Gato, 2012).
ANDRÉA JUSTE
Quando você era criança, gostava de leitura?
Quando criança, eu era leitora, mas, antes de ser leitora, era ouvidora de histórias, e minha avó me contava muitas histórias, meu pai me levava à biblioteca. Não sei se fui leitora ou se me fizeram leitora. Vivia em uma casa onde os livros era importantes e tinham muita relação com a vida.
Qual o papel dos pais para despertar o interesse das crianças pelos livros?
Na infância, o exemplo marca. O que é importante para os pais é importante para os filhos. Nas famílias esportistas, com hábitos saudáveis, os filhos entendem isso. As famílias muito sedentárias, com pais muito sedentários, os filhos geralmente são preguiçosos. Nas famílias nas quais livros e histórias são importantes, os pais leitores, de uma maneira geral, mostram que a leitura tem uso fora do sistema acadêmico - e isso é muito importante. Mas também os pais podem contar contos às crianças, ler histórias na hora de dormir, reservar tempo para falar com eles.
O que a escola deve fazer para incentivar a leitura? O que é preciso mudar atualmente para haver esse incentivo?
Muitas coisas precisam ser mudadas. Os professores leitores são tão importantes quanto os pais leitores. As crianças não creem num discurso que não veem na vida prática. A escola ensina coisas úteis e acadêmicas sobre a leitura, mas não se pode esquecer que a leitura também passa pelo coração e que a literatura precisa ter a ver com a experiência humana mais profunda. E isso, às vezes, se perde de vista na obsessão por ensinar, passar nos exames.
Você aborda a perda da infância pelos problemas sociais. O que os limites sociais provocam no desenvolvimento da criança?
A desigualdade social se constrói muito cedo na vida, a desigualdade nas oportunidades de aprendizagem. Aos 3 anos idade, já há evidências no vocabulário, na maneira de aprender, de procurar por livros, e isso é muito grave, pois é aos 3 anos que as crianças aprendem de forma natural. É muito importante que a escola ofereça oportunidade (de leitura) àqueles que não têm em casa por razões históricas e sociais.
Como fica a leitura nos tempos do computador? De que forma ele prejudica ou pode ajudar na leitura?
Não prejudica em nada. É preciso agregar todas as linguagens e suportes possíveis para ler de todas as maneiras. Hoje os jovens escrevem mais que nunca. Eles estão descobrindo que, com a escrita, podem dizer coisas que na vida real não poderiam. Mas há coisas que os livros permitem, e essa conversação com as pessoas que viveram antes e que escreveram de outras formas é importante. Que não fique tudo reduzido ao que circula pela web. Há coisas na vida que estão em lugares distintos. Precisamos reconhecer que falamos diferentes linguagens, escrevemos e lemos em muitos suportes e que todas essas são possibilidades. Se não reconhecemos que os jovens falam outras linguagens, estamos perdendo.
A leitura é uma forma de brincadeira. Qual a sua recomendação de estilo de leitura para crianças?
Quando falamos de crianças, há muitas idades. Na primeira infância, o jogo com as palavras é essencial, e os encantam as histórias rimadas, literárias, sonoras. As crianças atravessam muitos momentos na formação, e é importante o jogo com a linguagem. Mas não existe uma receita especial. A boa literatura possui muitas possibilidades.
A criança precisa ter tempo para brincar. Qual a importância de ter esse tempo? Para ler, também necessita-se de tempo. Que horas vão ler se vão para o colégio, ginástica etc?
Esse tempo de sonhar, imaginar, estar com amigos, fazer de conta é o tempo gratuito de cultivar a imaginação, e a aprendizagem necessita da imaginação.
O que os governos devem fazer para incentivar a leitura?
É preciso que haja bibliotecas, que haja pessoas formadas, que haja livros e que eles cheguem a lugares diferentes, que haja tudo o que possa ser feito para valorizar a cultura à infância, e é preciso preparar as pessoas que trabalham com crianças, que os pequenos passem por uma aprendizagem vivencial que tenha a ver com a imaginação.
Fonte: http://www.otempo.com.br/capa/brasil/vontade-de-ler-come%C3%A7a-com-o-exemplo-dentro-de-casa-1.271675
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