Teatro A faceta musical do Galpão

Grupo estreia “De Tempo Somos – Um Sarau do Galpão”, a partir de sua longa relação de proximidade com a música


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Temporal. Artistas lançam seu olhar sobre a passagem do tempo e o estado embriagado e libertador da criação artística
GUSTAVO ROCHA

Foi depois de um jantar à luz da lua, no Vale do Jequitinhonha, durante a turnê do espetáculo “Os Gigantes da Montanha”, que o grupo Galpão recobrou o novo velho desejo de se enveredar em um trabalho que reunisse seu vastíssimo repertório musical, construído ao longo de sua trajetória de 32 anos, em um espetáculo. O resultado da inspiração será apresentado ao público hoje (para convidados), quando o grupo estreia “Tempos Somos – Um Sarau do Grupo Galpão”, no Galpão Cine Horto.
“Todo mundo já sabe que temos história com a música de muito tempo. E ela sempre é pensada como dramaturgia, como uma forma de comunicação direta com a plateia”, explica Lydia Del Picchia, uma das diretoras do espetáculo, ao lado de Simone Ordones. “A gente diz que como músicos, somos ótimos atores”, se diverte a diretora.
O desejo de fazer um trabalho com as características de um sarau com repertório musical ronda o grupo desde 2000, quando, em conversas internas, eles admitiam a vontade de estudar mais a música, mas somente agora, no entanto, ele se concretiza. “No elenco dos ‘Gigantes’, nós temos dois atores que são músicos, Regina Souza e Luiz Rocha – este último assina a direção musical do espetáculo (leia entrevista na página 2) – e durante as turnês, nós passamos muito tempo na estrada, tocando, fazendo nossas cantorias”, comenta Lydia.
O caminho, então, foi fazer a seleção das músicas de seu repertório, dando a elas uma nova roupagem e novos arranjos. “Resolvemos voltar o olhar para nós mesmos. Não é como o grupo Galpão, em cena, tocando em seus espetáculos. Aqui, optamos por um formato mais próximo de um show musical, com mais violões, alguns acordeons”, alerta Lydia. Além disso, o grupo alinhavou a dramaturgia do espetáculo, com textos que falam da passagem do tempo e do estado embriagado e libertador que é inerente à criação artística. Reflexões e poemas de Eduardo Galeano, Anton Tchékhov, Olga Knipper, Calderón de la Barca, Charles Baudelaire, Manuel Bandeira, Nelson Rodrigues, Jack Kerouac, Paulo Leminski e José Saramago compõem esse caleidoscópio em que os atores do Galpão compartilham, com o público, suas indagações e vivências artísticas.
“Achamos que o sarau seria o formato mais adequado porque era como abrir nossa casa para as pessoas. Tudo foi feito por nós. Paulo André, no figurino, Eduardo Moreira na dramaturgia, Luiz Rocha na direção musical e nós duas na direção”, revela Simone.
O resultado disso é um espetáculo mais relaxado, entre a música e o teatro. “Essa estrutura de pocket show musical traz o teatro pontuando um pouco essa reflexão, falando do ator, da passagem do tempo. Esse roteiro construído pela música nos permitiu chegar perto dessa simplicidade e pensar, ‘Como é o Paulo André falando um texto em cena, sem ser esse lugar do depoimento?’. Foi um exercício muito rico pensando no trabalho do ator”, pontua Lygia.
Talvez a maior novidade do trabalho seja a primeira direção feminina dentro do grupo (Yara de Novaes foi convidada para dirigir “Tio Vânia”). “O curioso é que foram os homens que nos escolheram”, lembra Simone. “Teuda (Bara), Inês (Peixoto) e Fernanda (Vianna) estavam fora, fazendo novelas e sobramos somente eu e Simone e oito homens. Uma se segurou na outra para garantirmos o olhar feminino no grupo”, completa Lydia.
Além disso, o formato menos grandioso, comparado a outros espetáculos do grupo, permitiu tirá-los de uma certa região de conforto. “Essa discussão do formato dos espetáculos é recorrente, mas é difícil não se seduzir por um diretor como o Gabriel Villela (‘Romeu e Julieta’ e ‘Os Gigantes da Montanha’) ou Paulo de Moraes (‘Pequenos Milagres’). Foi ao mesmo tempo, uma provocação interna de levantar esse projeto dentro do desejo da gente. É uma reflexão desses 32 anos de história, quando falamos de músicas que ficaram no passado, mas ela tem esse poder de renovação. Ela se presentifica com novos arranjos”, finaliza Lydia.
Fonte: http://www.otempo.com.br/divers%C3%A3o/magazine/a-faceta-musical-do-galp%C3%A3o-1.959270

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