O capitalismo, os socialismos e o projeto do ecossocialismo

Uma das palavras mais difamadas na linguagem política neoliberal e capitalista é “socialismo”. Entende-se o porquê, pois ele comparece na história como um projeto alternativo à perversidade do capitalismo.
Alega-se que o socialismo nunca deu certo em nenhum lugar do mundo. Talvez uma das razões de manter o boicote à Cuba socialista por tantos anos da parte dos Estados Unidos se deva à vontade de mostrar ao mundo que o socialismo realmente não presta e não deve ser buscado como forma de organização da sociedade. E Obama teve que reconhecer que os EUA fracassaram. O capitalismo não é a única forma de organizar a produção e uma sociedade.
Mas é forçoso reconhecer que aquele socialismo nunca foi o socialismo pensado por seus teóricos, há três séculos. Na verdade, era um capitalismo do Estado autoritário.
Mas, se tomarmos como parâmetro critérios humanísticos, éticos e sociais mínimos, devemos reconhecer que o produtivismo, em geral, e o capitalismo também não deram certo. Como pode dar certo um sistema que se propõe um mesquinho ideal de enriquecimento ilimitado, sem qualquer consideração? Devastou e continua devastando ecossistemas inteiros, desflorestando grande parte da área verde do mundo, envenenando os solos, poluindo as águas, contaminando o ar, erodindo a biodiversidade na razão de 100 mil espécies de seres vivos por ano, destruindo a base físico-química que sustenta a vida e pondo em risco o futuro de nossa civilização, suscitando a imagem tétrica de uma Terra depredada e coberta de cadáveres e eventualmente sem nós como espécie humana. Esse sistema serve bem apenas a cerca de 2 bilhões de pessoas, que se afogam no consumo suntuoso e no desperdício atroz. Ocorre que somos já mais de 7 bilhões de pessoas, das quais quase 1 bilhão vive na mais canina pobreza e miséria. Mais ainda: os cálculos foram feitos, se esse sistema quisesse universalizar o bem-estar dos países opulentos, precisaríamos de pelo menos três Terras iguais a esta.
Que sistema atenderá as necessidades fundamentais da humanidade carente? Não será o capitalismo, que traz logo duas injustiças: a social, com a riqueza de poucos e a pobreza de muitos, e a ecológica, com a devastação maciça da natureza.
Deixando de lado os vários tipos de socialismo, restringimo-nos ao ecossocialismo contemporâneo. Surgido nos anos 70, com Raymon Williams, James O’Connor, Manuel Sacristán e Michael Löwy, ele afasta-se dos socialismos anteriores e apresenta uma proposta radical que “almeja não só a transformação das relações de produção, do aparelho produtivo e do padrão de consumo dominante, mas, sobretudo, construir um novo tipo de civilização, em ruptura com os fundamentos da civilização capitalista/industrialista ocidental moderna”.
Os tópicos principais dessa proposta foram expostos no Manifesto Ecossocialista Internacional (2001), que deu origem à Rede Ecossocialista Internacional (2007). Na Declaração Ecossocialista de Belém (2007), se diz claramente: “A humanidade enfrenta hoje um escolha extrema: ecossocialismo ou barbárie…” Essa proposta se alinha ao que também propõe a Carta da Terra, aprovada e assumida pela Unesco em 2003.
Dentro de pouco, seremos todos ecossocialistas não por opção ideológica, mas por razões matemáticas: dispomos apenas de escassos bens naturais com os quais devemos atender a toda a comunidade de vida. Ou repartimos tais bens com um mínimo de equidade entre todos, ou não haverá uma Arca de Noé que nos salve. É vida ou morte.

Fonte: http://www.otempo.com.br/opini%C3%A3o/leonardo-boff/o-capitalismo-os-socialismos-e-o-projeto-do-ecossocialismo-1.1032226

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