Estrelas da canção popular


É lugar-comum dizer que o Brasil é o país das cantoras. De Carmem Miranda a Cássia Eller, elas forjaram o que hoje se chama de MPB. Na primeira metade do século XX, reinaram imbatíveis nos auditórios das rádios, num momento em que o país era integrado através desse veículo de comunicação. Mesmo após o advento dos "compositores-cantores", como Chico Buarque e Caetano Veloso, surgidos na era dos festivais, as intérpretes continuaram a revelar novos autores - caso de Elis Regina - ou apontar novos caminhos estéticos, como o de Nara Leão.

Para mostrar a importância do canto feminino no país, o pesquisador Rodrigo Faour montou, junto com a gravadora EMI, a série Super Divas. A coleção é composta por CDs cujo encarte contém minibiografias, letras das músicas, capas dos discos dos quais as faixas foram extraídas e, em alguns casos, entrevistas com as artistas feitas especialmente para o projeto.

Faour mergulhou no acervo das gravadoras Copacabana e Odeon, hoje sob tutela da EMI, para traçar um panorama da voz feminina no Brasil entre as décadas de 1940 e 1980, apontar sua importância no período e estabelecer as diferenças entre as que integram a seleção e as novas intérpretes. "Os sucessos tinham voz através das cantoras. Cada uma tinha um estilo diferente. 
Você ouvia e sabia quem estava cantando. Hoje, quase todas parecem iguais, adotando Marisa Monte como parâmetro. O cool virou cool mesmo, ficou tudo frio", fuzila o pesquisador, que, há quase dez anos, tem reeditado discos históricos e séries especiais.

Assim, chegam ao mercado, pela primeira vez, coletâneas de Maria Alcina, Carmélia Alves, Rosana Toledo e Ademilde Fonseca. Foi por causa desta última que Faour teve a ideia de montar a série. "Eu achava um absurdo uma cantora como ela, criadora do choro cantado e de uma nova perspectiva para a MPB, não ter nada em formato digital. Foi depois que pensei em outras cantoras que também estavam esquecidas pela indústria fonográfica", revela. 

Depoimento. Para compensar o descaso com sua obra, Ademilde mereceu um CD duplo na série - assim como Dalva de Oliveira - e deu um depoimento a Faour reproduzido no encarte, no qual conta sua história de vida e comenta as faixas selecionadas. No segundo disco, está a íntegra do LP "À La Miranda", gravado em 1958 em homenagem a Carmem Miranda. Ademilde morreu em 27 de março, quando a compilação estava prestes a ir para a fábrica. "Ela se foi, mas consegui eternizar o que ela deixou", conta o pesquisador.

Outras cantoras já tiveram seu repertório lançado em coletâneas diversas vezes. Mas, em Super Divas, elas estão sob viés diferente, seja no período compilado ou no foco das músicas selecionadas. Aracy de Almeida, Cláudia e Eliana Pittman têm, pela primeira vez, um retrato de suas passagens pela Odeon. "Essa fase da Aracy, que entrou na gravadora em 1940, estava há mais de 60 anos fora de catálogo. No caso da Cláudia, eu já havia montado uma coletânea dela com foco nos anos 1960, em outra gravadora. Mas é na década seguinte que ela tem seu auge, e quase nada havia saído em CD", salienta Faour.

Sobre Pittman, ele diz desfazer uma injustiça histórica, já que a filha adotiva do jazzista Booker Pittman estava em seu auge nos anos 1970 e, de repente, foi rechaçada pelas gravadoras. Faour a compara a Wilson Simonal, que, após ser tachado de colaborador do regime militar, viu a carreira cair no ostracismo. "No encarte do CD, ela conta que quiseram fazer dela uma cantora de disco music. Ela não aceitou, por ser intimamente ligada às raízes brasileiras", afirma.

Sempre identificada pelas interpretações de tangos e boleros, Ângela Maria tem uma faceta diferente mostrada em seu CD. Sambas-enredo e marchinhas de Carnaval que nunca integraram seus discos de carreira foram selecionados. Até uma versão remixada do clássico "Babalu" entrou no balaio. "Ela já tinha muitas coletâneas, sempre com as mesmas músicas. Gravou muita coisa tida como brega, mas ela era muito mais do que isso".

Deixar um legado para as novas gerações é uma preocupação do pesquisador. "Na coletânea da Elizeth Cardoso, coloquei ‘Eu Bebo Sim’, o maior sucesso dela, que já havia saído em CD, porque é a música que a juventude conhece. Se alguém comprar o CD por causa dela, vai perceber o quanto Elizeth foi importante para a MPB e que sua obra é muito mais que uma música".



Fonte: http://www.otempo.com.br/noticias/ultimas/?IdNoticia=206667,OTE&busca=Estrelas%20da%20can%E7%E3o%20popular&pagina=1



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