Menina afegã abusada pelo marido vence batalha judicial


Decisão da Corte é vista como vitória para direitos da mulher muçulmana


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GRAHAM BOWLEY
The New York Times

Vida nova. Sahar Gul (à esq.) gosta de brincar com uma amiga no abrigo e está se tornando cada vez mais independente, segundo cuidadores
KUNI TAKAHASHI/THE NEW YORK TIMES

Cabul, Afeganistão. Obrigada a se casar com um homem que tinha mais que o dobro de sua idade, a menina afegã Sahar Gul, 14, que era torturada e estuprada constantemente, conseguiu, no mês passado, uma importante vitória. A Justiça do país condenou a dez anos de prisão cada um dos três parentes do marido, Ghulam Sakhi, que a agrediram. A decisão foi anunciada como um triunfo legal que ressalta os avanços dos direitos da mulher nos países muçulmanos na última década.


A grande repercussão que a história teve na mídia do Afeganistão fez com que o presidente do país, Hamid Karzai, pedisse por um julgamento rápido. Em uma Corte distrital de Cabul, o juiz declarou sua decisão em frente a um mar de microfones das televisões afegãs. A polícia prendeu a sogra de Sahar, Siyamoi, a cunhada, Mahkhurd, e também o sogro, Amanullah, descoberto escondido debaixo de uma burca e um cobertor.

Quando tinha 13 anos, Sahar casou-se com Sakhi, que tem em torno de 30 anos. Em Baghlan, cidade onde foi morar com o marido, a garota foi rapidamente colocada para fazer as tarefas domésticas, mas conseguiu resistir à consumação do casamento por semanas.

De acordo com o advogado de Sahar, Mushtari Daqiq, certo dia, quando a menina reclamou de dor de cabeça, sua sogra lhe deu sedativo, dizendo que era analgésico. "Quando ela acordou, percebeu que tinha sido ‘usada’ pelo marido", afirma o advogado. 

Ehsanullah, um vizinho, conta ter ouvido gritos vindos da casa uma noite. Na manhã seguinte, a mãe dele foi até a casa da jovem. "Sahar havia perdido muito peso, suas mãos estavam cobertas de hematomas e machucados. Uma das mãos estava quebrada, mas sua sogra a estava forçando a lavar as roupas", disse o homem, lembrando o relato da mãe.

O vizinho acrescentou que a garota "manteve a cabeça abaixada o tempo todo que minha mãe esteve lá". Segundo ele, os gritos pararam depois que um grupo de pessoas mais velhas da cidade questionou Sakhi.


Cárcere. A família de Sakhi afirmou que ficou frustrada por a menina não fazer o trabalho doméstico como esperado. Assim, ela foi colocada no porão, onde dormia sobre o chão e tinha mãos e pés atados com cordas. A menina recebia apenas pão e água para se alimentar e era fisicamente agredida. Segundo Sahar e seu advogado, a maioria das agressões vinha de Amanullah. "Ela estava sem salvação. Não tinha qualquer esperança por sua vida", afirma Daqiq. 

Apesar das várias tentativas de contato com a garota, o meio-irmão e o tio dela eram proibidos de vê-la. A visita só foi possível com a companhia de dois policiais, em dezembro do ano passado, seis meses depois do casamento com Sakhi. "Com a luz das lanternas, encontramos Sahar deitada em uma pilha de feno", contou um dos policiais.

"Ela estava sempre gemendo, em uma situação horrível. Não conseguia se mexer e tivemos que carregá-la para o hospital", conta o policial. Lá, ela começou a receber tratamento adequado. "Quando ela viu comida, ficou muito animada", lembra Zarifi, médico que a atendeu. 


Traduzido por Raquel Sodré

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