Dos superatletas para você


Tratamentos, exames e diversas tecnologias desenvolvidas a partir dos estudos com os esportistas de elite chegam ao dia a dia das clínicas e hospitais e beneficiam milhares de pacientes

Mônica Tarantino e Monique Oliveira
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Quando um paciente com insuficiência cardíaca recebe um programa de exercícios físicos personalizado ou um praticante de tênis é submetido a uma cirurgia pouquíssimo agressiva para recuperar uma lesão no quadril, eles podem não saber, mas estão se benefíciando de técnicas avançadas usadas antes em atletas. Tratamentos como esses só foram possíveis graças às pesquisas da ciência do esporte, realizadas para entender do que são feitos os atletas de elite, esses seres de incrível capacidade física que, mais uma vez, encantaram o mundo na última Olimpíada. Gente do porte do jamaicano Usain Bolt, do americano Michael Phelps e da brasileira Yane Marques. Medalha de bronze no pentatlo moderno (esgrima, natação, hipismo, tiro esportivo e corrida), a pernambucana de 28 anos creditou parte de seu sucesso a esses estudos. “Nos últimos anos, temos trabalhado muito em relação à ciência do esporte: biomecânica, biomedicina, uma série de testes e exames”, disse ela logo após a vitória. “Isso pode fazer diferença de meio segundo numa prova. Foi o que garantiu meu melhor tempo na natação.” Cedo ou tarde, os ensinamentos extraídos dessas pesquisas migram do Olimpo do esporte para o dia a dia das clínicas e hospitais. E lá também são o diferencial: criam uma medicina sofisticada, eficaz. A medicina vinda dos superatletas.
A título de comparação, o que acontece com o esporte e a medicina é o mesmo observado com a Fórmula 1 e a indústria automobilística. Ou seja, a partir do excepcional, obtêm-se lições que servem de base para soluções que facilitam a vida de todos. Muito do design e da potência dos carros de hoje veio de conceitos criados para a Fórmula 1. No que diz respeito ao esporte e à saúde, a ciência aprendeu demais sobre o corpo humano estudando os superatletas. Uma das maiores contribuições foi no campo cardíaco. Em 1989, a observação de esquiadores de cross country (espécie de maratona com distâncias que chegam a 50 quilômetros) mostrou que o coração deles tinha dimensões diferentes. “Ele chega a ser 50% maior na espessura do ventrículo esquerdo, responsável por bombear o sangue”, afirma o médico Nabil Ghorayeb, da Sociedade Brasileira de Cardiologia. Esse aumento de tamanho se deve à necessidade imposta ao coração dos atletas de mandar mais sangue para o corpo, submetido a extrema demanda.
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A descoberta inaugurou um vasto campo de pesquisa para entender como funciona o coração do atleta. O objetivo era observar seus limites – e cuidar para não ultrapassá-los – e encontrar atalhos para melhorar a performance. Dessa busca brotaram informações preciosas, como a de que é preciso se exercitar dentro de uma frequência cardíaca individual. “Dados como esses ajudaram a criar planos de exercícios para pacientes com doenças cardíacas”, diz o médico Jomar de Souza, presidente da Sociedade Brasileira de Medicina do Exercício e do Esporte.
No Instituto do Coração, em São Paulo, o programa de reabilitação para portadores de insuficiência cardíaca (incapacidade de o coração bombear o sangue) foi montado com base nessas descobertas. “Aprendemos a dosar tanto os benefícios quanto os desgastes causados pelo exercício”, conta Carlos Eduardo Negrão, diretor da Unidade de Reabilitação Cardiovascular da instituição. Essas informações auxiliam ainda no tratamento da hipertensão. “Observando os atletas, vimos que a atividade física aumenta a rede de vasos sanguíneos nos músculos, o que diminui a pressão arterial”, diz Negrão. “Adaptamos esse conhecimento para os pacientes.”

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